I. Introdução
No início da década de '90 o conceito de "MPV", Multi Purpose Van, estava já bastante maturado. Os contrutores generalistas encarregaram-se de descobrir um nicho de mercado por explorar, que veio a ser desenvolvido ao longo dos anos 80. Na Europa, a guerra foi grande: A Renault, por intermédio da Matra, desenvolveu a primordial "Espace", a General Motors apresentou a "APV", comercializada em Portugal sob a marca Pontiac, a Toyota lançou a "Prévia" e a Chrysler a "Voyager". Quase todos os grandes grupos possuiam, ou planeavam possuir, produtos nesta nova classe, pensada para transportar mais pessoas e mais volume de carga, com melhores índices de conforto que as tradicionais breaks (derivadas de turismos de segmento médio) ou furgões adaptados a transporte de passageiros.
II. De La Chapelle
Pequeno construtor francês oficialmente fundado em 1975, da região de Saint-Chamond, famoso até 1990 apenas pelas suas reconhecidamente valorizadas réplicas "deformadas" (proporções ligeiramente alteradas, distâncias entre eixos reduzidas, miniaturas, etc), de Bugattis ou outros clássicos de renome, e pelo legado da "De La Chapelle-Stimula", relevante construtor automóvel de início do século XX, sediado na mesma região.
Orientada para um público específico e exigente, e com uma produção anual reduzida, a marca fundada por Xavier De La Chapelle esteve sempre associada a um perfeccionismo e a uma qualidade de execução superior à de qualquer construtor generalista francês.
III. Um MPV sobredimensionado
De acordo com o site oficial da marca, o aparecimento da De La Chapelle Parcours foi motivado pelo caderno de encargos de um "cliente estrangeiro". Facto no mínimo curioso, no panorama de um pequeno construtor, por mais experimentalista que ele fosse. Talvez por isso, a Parcours apresentava-se bastante maior que a concorrência, ostentando mais de 5.30m de comprimento (uma Grand-Espace dos nossos dias possui menos de 4.90m). Com mais de dois metros de largura, e a pesar 2200kgs, impunha-se uma motorização minimamente potente. Mas a De La Chapelle não se contentou um motor meramente enérgico: Recorreu-se ao V8 Mercedes de quatro árvores de cames à cabeça e 326cv, o mesmo que equipava, à data, os coupés 500SL e CL, e as berlinas de 5000cc das classes "E" e "S". Estávamos perante um misto, assumido, de limousine performante e de MPV, inédito até então.
IV. Requintes de malvadez
Só um colosso disforme e atabalhoado parecia poder incluir tanta excentricidade junta. Mas, espantosamente, da "P.M.E." de Brignais nasceu uma viatura elegante e tecnologicamente muitíssimo avançada. Arrisco-me a dizer que, se tivesse conhecido números de produção relevantes, se arriscaria a ser um dos mais avançados automóveis de série no mercado, ombreando, a nível de argumentos, com qualquer Lamborghini Diablo SV ou Honda NSX.
Em vez de recorrer a longarinas, a De La Chapelle Parcours possuía um chassis tubolar em aço, associado a um ninho de abelha, à-la-F1, construído integralmente em alumínio. A carroceria era num material compósito, em deterimento da convencional chapa. Ao interior correspondia um luxo asiático: Duas televisões, dois telefones e fax (coordenados por uma mini-central telefónica), computador de bordo, climatização automática, uma câmara de filmar interna com gravação, bancos recaro estofados em pele, um mini-bar... ...Nos quais foram depositados cuidados a nível ergonómico.
Era também possível, à boa moda do espírito "MPV" vigente, configurar o abundante espaço interior. A Parcours podia albergar 4, 5, 6, 7, ou 8 passageiros, já que a sua habitabilidade era quase totalmente costumizável. Existia ainda uma câmara externa, que substituía o espelho retrovisor central, com o objectivo de tornar mais fácil a maneabilidade, nomeadamente em manobras de estacionamento.
Todos estes predicados estavam, meritoriamente, associados a linhas extremamente sóbrias quer no interior, quer sobre tudo no exterior. A frente distingue-se por ópticas lineares, estilo "Lagonda", e por um spoiler dianteiro. Lateralmente, vive-se da horizontalidade, por intermédio de linhas rectilíneas, extensíveis até às jantes. Só mesmo a traseira, mais geometrizada e com quatro grandes ponteiras de escape - hoje, muito na moda - e a baixa altura ao solo denunciavam que algo de anormal se passava naquela motorização.
Uma observação cuidada revela-nos um compartimento para o motor muito maior do que em qualquer outro monovolume, aqui bem disfarçado pela estética cuidada.
A transmissão parecia ser o que de menos avançado era proposto. A caixa de velocidades era a mesma da Mercedes, automática, lenta e de quatro velocidades. Uma opção racional para lidar com mais de 300cv e 450nm, fiável, mas que ficava muito aquém dos delírios acima relatados (exigir-se-ia uma boa caixa manual de 5 velocidades). Ciclisticamente, acautelando previsíveis comportamentos mais radicais - esta Parcours era potencialmente provocadora - a De La Chapelle decidiu associar-lhe uma tracção integral não-permanente, com repartição evolutiva de potência pelos eixos. O que, associado a um amortecimento radical (triângulos sobrepostos à frente e atrás com amortecedores hidro-pneumáticos) fazia antever um comportamento bastante promissor em percursos mais sinuosos, ou mesmo em pista.
V. Check, please!
Em 1992, a De La Chapelle Parcours apresentava-se à venda por 1.000.000 de Francos. Qualquer coisa como 25.000 contos. Significativamente mais que um M5 E34, por exemplo. Ciente do exagero do preço, chegou a propôr-se uma Parcours mais "light", e menos potente, por apenas... ...800.000 francos. O que, como é óbvio, se traduziu em apenas duas vendas, para além do protótipo realizado em 1990.
Designada por "Business", e pensada na óptica do passageiro exigente, mas, também, na de um condutor claramente acima da média, a De La Chapelle Parcours foi um dos mais belicistas e fetishistas monovolumes da história automóvel.
Os dois exemplares vendidos nunca foram homologados, de acordo com a informação disponível. Há, contudo, registos de pelo menos um monovolume matriculado. Conhecem-se duas cores: Preto e Prateado.
Recentemente, em Agosto de 2010, esteve um raríssimo exemplar à venda. Terá tido comprador? Tratar-se-ia do protótipo, ou um dos dois "originais"? Ou o primordial original, encomendado pelo tal cliente estrangeiro?
Facto foi que a De La Chapelle continuou, descomplexadamente, a procurar o invulgar. Em 1998 voltou à carga, com o seu "Roadster" de dois lugares, novamente bem motorizado...
VI. Dados técnicos
Exquisite Roadrunners Blog Rating: 767.9
Sem comentários:
Enviar um comentário